Mulheres e política: decisões do TSE combatem fraude à cota de gênero

A Justiça Eleitoral elegeu o tema como prioridade para garantir que os recursos destinados às campanhas femininas efetivamente cheguem a essas mulheres.
Portal TSE - Mesmo com o firme compromisso da Justiça Eleitoral e com ações afirmativas que buscam garantir mais mulheres na política, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) tem julgado diversos casos de candidaturas femininas fictícias com fraudes comprovadas da chamada cota de gênero.

O estímulo à participação feminina por meio da cota de gênero está previsto na legislação brasileira há 26 anos, mais exatamente no artigo 10, parágrafo 3º, da Lei das Eleições (Lei nº 9.504/1997). Funciona assim: cada partido ou coligação deve preencher o mínimo de 30% e o máximo de 70% para candidaturas de cada sexo, nas eleições para Câmara dos Deputados, Câmara Legislativa do Distrito Federal, Assembleias Legislativas e Câmaras Municipais.

A regra passou a ser obrigatória a partir de 2009. Desde então houve vários avanços, mas há, ainda, um longo caminho a percorrer. Conforme já destacado pelo presidente do TSE, ministro Alexandre de Moraes, é fundamental que os partidos deem todo o apoio necessário, legal e judicial às candidaturas das mulheres para que se possa ter um equilíbrio maior na participação de gênero em todos os segmentos da política nacional.

Avanços
Recentemente, a composição das cadeiras de vereadores precisou ser alterada em dezenas de cidades após decisões do Plenário que comprovaram irregularidades no cumprimento da cota de gênero.

De acordo com dados da área de jurisprudência do TSE, em relação às eleições municipais de 2020, pelo menos 38 acórdãos do Tribunal resultaram em cassação de eleitos por partidos que, comprovadamente, descumpriram a regra. Entre eles estão os casos de Jacobina (BA), Araruama (RJ), Elias Fausto (SP), Imbé (RS), Maruim (SE), Barra de São Miguel (AL), Serra Azul (SP) e Quixadá (CE).

Evolução
O debate em torno do tema mostra que, desde 2020, houve um avanço na efetiva participação feminina no processo eleitoral brasileiro. Os números dos últimos pleitos refletem essa evolução: entre 2016 e 2020 (eleições municipais), houve um aumento de 18% no número de candidatas e de 7,5% entre 2018 e 2022 (eleições gerais federais e estaduais). Já no total de mulheres eleitas, houve um aumento de 17,5% entre 2016 e 2020 e de 8,36% entre 2018 e 2020.

Pela análise dos números disponíveis na página Estatísticas do TSE, observa-se ainda que, em 20 anos, entre as Eleições Municipais de 2000 e 2020, dobrou também o número de candidatas aos pleitos, passando de 71,6 mil para 187 mil mulheres candidatas. Verificou-se um aumento de 50% na quantidade de eleitas ao se compararem essas eleições.

Segundo a ministra do TSE Maria Claudia Bucchianeri, desde a implantação do voto feminino, em 1932, houve muitos avanços, mas ainda falta muito. “Nas Eleições de 2022 houve um aumento na presença feminina, que hoje se aproxima de 18% no Congresso Nacional. Isso é muito se pensarmos em duas ou três legislaturas para trás, mas a gente entende que ainda falta muito para avançar, especialmente quando se considera que as mulheres compõem 53% do eleitorado”, destaca.


A ministra lembra que, em 2022, foram aproximadamente 10 mil candidatas mulheres e que só 311 se reelegeram. “É uma taxa de conversão muito baixa, de aproximadamente 3%. A gente precisa dar robustez e estrutura às nossas candidatas”, ressalta.

Jurisprudência
Em 2019, ao julgar o caso de candidaturas fictícias nas eleições de Valença (PI), relativas às eleições de 2016, o TSE fez definições importantes, entre elas a de que a comprovação da fraude derruba toda a coligação ou partido, ou seja, compromete todo o DRAP (Demonstrativo de Regularidade de Atos Partidários) do partido naquela localidade.

No ano passado, ao julgar o caso dos vereadores de Jacobina (BA), o TSE definiu uma série de critérios para a identificação da fraude à cota de gênero. São eles: a obtenção de votação zerada ou pífia das candidatas; a prestação de contas com idêntica movimentação financeira; e ausência de atos efetivos de campanha.

Responsabilidade
Recentemente, outro debate ganhou destaque e será discutido pelo Plenário do TSE. Trata-se da abrangência de envolvimento dos dirigentes partidários nas fraudes praticadas pelos partidos.

O tema foi levantado pela ministra Maria Cláudia no dia 23 de fevereiro deste ano, no julgamento que trata do município de Andradina (SP). A ministra chamou atenção contra a banalização da inelegibilidade de mulheres envolvidas na fraude e ausência de responsabilização de quem está à frente das legendas. “Temos percebido um certo automatismo na imposição irrestrita de inelegibilidade apenas às mulheres, sem a inclusão dos dirigentes partidários”, afirmou.

“As mulheres são lançadas muitas vezes sequer sem saber, têm a assinatura falsificada. Algumas vezes são coagidas ou ameaçadas e muitas são abandonadas na campanha, sem estrutura alguma. O TSE tem punido com muito rigor e determinando a cassação da lista toda, mas estamos agora debatendo a inelegibilidade também dos dirigentes partidários. Tudo numa tentativa de um ambiente pedagógico em que esse comportamento não valha mais a pena”, destacou.

Caminhos
De acordo com Helena Branco, supervisora de advocacy da organização Girl Up Brasil, além da necessidade de maior fiscalização e controle por parte das autoridades, o caminho para que não haja mais fraudes à cota de gênero passa pela promoção de ações educativas e de conscientização sobre o real significado da representatividade de gênero e da diversidade na política. “O Estado, assim como a sociedade civil, também deve incentivar a participação de mulheres nos processos eleitorais, por meio de programas de apoio a candidaturas femininas”, ressaltou.

Para ela, garantir mais mulheres na política deve ser uma preocupação de todas e todos, porque representatividade é uma das principais ferramentas de exercício democrático. “Não é possível fazer política sem entender, ouvir, se aprofundar na realidade de cada parcela da sociedade, acolhendo suas necessidades. Só é possível fazer uma política fiel à diversidade brasileira se garantirmos que todas e todos tenham a oportunidade de serem representados por pessoas que atendam seus desejos”, disse.

Outras ações afirmativas
Em 2018, na tentativa de avançar no tema, o TSE decidiu que os partidos políticos devem reservar pelo menos 30% dos recursos do Fundo Eleitoral para financiar candidaturas femininas e que o mesmo percentual deve ser considerado em relação ao tempo destinado à propaganda eleitoral gratuita no rádio e na TV. E, se o número de candidatas representar mais que a cota, o repasse dos recursos deve ocorrer na mesma proporção.

Para a ministra Maria Claudia, é preciso dotar as candidaturas femininas de viabilidade material. “O que nós ouvimos das mulheres é que elas até aparecem nos programas de rádio e TV, mas que as participações femininas acontecem às quatro da manhã, quando a audiência é um tracinho apenas”, reforçou.

Já em maio de 2020, o TSE afirmou ser aplicável reserva de gênero para mulheres nas eleições para órgãos partidários. A manifestação foi feita em consulta enviada à corte pela senadora Lídice da Mata. Não é regra fixada, portanto, não tem efeito vinculativo para a análise e a aprovação, por parte da Justiça Eleitoral, das anotações de órgãos partidários.

Participa Mulher
Para incentivar o protagonismo feminino na política a Comissão Gestora de Política de Gênero do TSE (TSE Mulheres) criou o projeto #ParticipaMulher. A página na internet dessa campanha permanente da Justiça Eleitoral reúne informações sobre a história do voto feminino, as primeiras mulheres a conquistar espaços de relevância no meio político e notícias que abordam a atualidade dessa participação.

A Comissão TSE Mulheres foi instituída em 2019 para atuar no planejamento e no acompanhamento de ações relacionadas ao incentivo à participação feminina na política e na Justiça Eleitoral. A ideia é inspirar mulheres a ocuparem cargos políticos e mostrar que o aumento de lideranças femininas é bom para toda a sociedade.

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